Há um céu encoberto por um fumo escuro e um estranho cheiro no ar aqui no Porto e já não é a queimado. Algo arde, para lá das “óbvias” florestas e matas deste desgraçado país. E tenho a sensação de que já vi isto antes.
O jogo da Supertaça, o Rafa e nós
Em primeiro lugar, é estranho não estarmos a disputar o (único?) troféu lusitano de relevo onde somos claramente os melhores – desde 2013 que não estamos lá, o que significa que não vencemos nem a Liga nem a Taça de Portugal durante 3 longos e penosos anos.
Em segundo, o Benfica-Braga: para lá da costumeira histeria da TVi em torno da nova vedeta do SLB, o tal Cervi que marcou o primeiro golo, foi impressionante o ritmo, a intensidade e a energia daquele arranque do Benfica. Comparando com o nosso jogo de apresentação, diria que jogamos parados… Foram 20 minutos avassaladores, a lembrar as cavalgadas dos tempos vermelhuscos do Jorge Jesus. Claro que, como nesse tempo, acabava-se o folgo e o adversário devolvia como podia a “gentileza” mas, regra geral, o jogo ficava resolvido na primeira meia hora. No domingo não foi isso que aconteceu, por obra do acaso, por miopia do árbitro e alguma azelhice.
Mas o meu interesse na Supertaça era outro: um baixinho chamado Rafa. E este não me desiludiu. Aliás, fazendo fé no que já o vi fazer e na atuação de domingo, é muito difícil perceber como ao longo dos últimos 2 anos foi existindo dinheiro para o Porto meter tantos barretes e não existe o suficiente para convencer o Salvador e adquirir este jogador. Se o FCP perder o Rafa para o Benfica não será só mais um grande jogador que nos passa ao lado e reforça o nosso maior rival, será a imagem mais significativa do nosso declínio desportivo e financeiro. A nossa equipa precisa de um jogador que resolva jogos sozinho – este portuguesinho de baixa estatura, discreto e reservado, é um enorme jogador. Tem velocidade, técnica e raça em quantidades apreciáveis e tem apenas 23 anos.
Quem viu dois pormenores da sua atuação no domingo poderia até nunca o ter visto jogar mas entenderia que não existem muitos jogadores capazes de fazer aquilo em Portugal: o primeiro exemplo foi dado pelo modo como recebeu um passe longo, do outro lado do campo, controlando a bola perfeitamente e no movimento imediato “deu um nó” no defesa esquerdo espanhol e o retirou da jogada; o segundo é uma situação que não teve um final feliz mas que é uma demonstração de querer, de velocidade e de técnica brutal – o lance em que, partindo atrasado em relação a um colega de equipa e a alguns defesas do SLB (ok, o Luisão não conta…) chega primeiro à bola, rodeia o guarda-redes contrário e… falhou. Mas fazer aquela aceleração desde a linha divisória do campo, depois de uma hora de jogo, com um calor sufucante, é mesmo algo de sublime, independentemente do resultado final da jogada. Resumindo: esta deveria ser a contratação prioritária do Porto para esta época, custe o que custar. Mesmo por 20 milhões, se nos der 2 boas épocas e sair para o estrangeiro depois será sempre um ótimo negócio.
Contratações, vendas que não acontecem e filmes que já vimos
Filme 1 – a quase contratação do central Alex encaixa num velho hábito de quem não tem dinheiro para comprar jovens promessas e enterra o pouco que tem em “nomes”, jogadores que passaram por grandes clubes mas que por algum motivo óbvio já não estão lá – para quem se lembra do Pizzi, do Esnaider e o mais recente playboy argentino que contratamos isto é algo fácil de perceber. São contratações boas para entreter adeptos menos lúcidos mas que mais cedo ou mais tarde se revelam brutais erros desportivos. Como dizem os ingleses: a falhada contratação deste “has been” quer dizer que ” we dodge a bullet”.
Filme 2 – qual é a melhor maneira de desvalorizar um jogador que se quer vender? É tornar evidente que não se conta com ele. O modo como a novela Indi está a decorrer é um claro exemplo de má gestão – não faz parte dos eleitos do treinador, depois é reintegrado, não joga na apresentação, não é inscrito na Champions e agora é relegado para a equipa B. Para lá do óbvio, que é o facto do Marcano não ser melhor do que este luso-holandês e apesar disso ser titular no centro da defesa, que melhor maneira existe de dificultar a venda de um jogador que foi caro do que tratá-lo como lixo?
Filme 3 – um novo pinheiro para o ataque ou a ressurreição do fenómeno Janko. Nunca vi jogar o o belga de 27 anos e 1,91 metros que acabamos de contratar. Parece-me pouco crível que, com esta idade e jogando num campeonato fraquinho que apesar de tudo tem alguma visibilidade nunca se tenha feito notar. Os números relativos a golos e assistências não impressionam, o facto de só ter sido internacional pelo seu país uma vez também é fraco currículo internacional, pelo que as minhas expectativas são bastante baixas. Se a ideia era ter um ponta de lança corpulento para carregar sobre as defesas mais fechadas em momentos de desespero, o melhor seria manter o Gonçalo Paciência no plantel – é português, tem técnica e ainda tem idade para evoluir. A cereja no topo do bolo do desvario que esta contratação parece demonstrar existir foi ter-se concluído que, num dos momentos mais importantes da época – a pré-eliminatória da Champions – este Laurent Depoitre não vai poder jogar…
Pode até ser que me engane, e que de repente surjam compradores generosos que levem daqui o Indi, o Reys, o Brahimi, o Aboubakar, o Quintero e, já agora, o Marcano, deixando dinheiro em quantidade suficiente para Rafa e para mais um central decente. Mas, para já, a única coisa positiva e a esperança mais luminosa desta época que está a começar chama-se André Silva. É muito bom, vai ser ainda melhor, mas não chega para inverter a trajetória dos últimos anos.
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